Como Garantir a Nacionalidade do Seu Filho Nascido em Portugal Antes da Mudança na Lei

Dra. Anna Clara Palmeira

11/3/20254 min ler

A legislação da nacionalidade portuguesa está, mais uma vez, em processo de transformação. O Parlamento aprovou um texto de lei que, assim que for promulgado pelo Presidente da República e publicado, irá fechar uma porta importante para a aquisição de nacionalidade. Esta mudança afeta diretamente famílias de estrangeiros residentes no país e os seus filhos nascidos em território português.

O nosso objetivo hoje é explicar, de forma muito clara, que porta é esta, quem ela beneficia atualmente e por que é tão urgente agir.

O Ponto de Partida: Nascer em Portugal Nem Sempre É Suficiente

Muitos clientes chegam ao nosso escritório com a ideia de que o simples facto de uma criança nascer em Portugal lhe confere automaticamente a nacionalidade portuguesa. É fundamental esclarecer que não é bem assim.

Para que uma criança, filha de estrangeiros, tenha direito à nacionalidade originária (aquela que considera a pessoa portuguesa desde o nascimento), a lei exige, entre outras hipóteses, que um dos pais tenha residência legal em Portugal no momento do nascimento. Se, no dia exato em que a criança nasce, os pais ainda não são titulares de uma Autorização de Residência, essa via de nacionalidade originária fica, à partida, fechada.

É precisamente para estas crianças, que "perderam" a primeira oportunidade, que a lei atual prevê uma "segunda oportunidade" através da naturalização. A naturalização é uma forma de nacionalidade adquirida, ou seja, produz efeitos apenas a partir do momento em que é concedida.

A Via Atual: A Naturalização pelo Artigo 6.º, n.º 2

Esta "segunda oportunidade" está prevista no Artigo 6.º, número 2, da Lei da Nacionalidade. A lei diz que o Governo pode conceder a nacionalidade, por naturalização, aos menores nascidos em território português, desde que no momento do pedido eles preencham uma das seguintes condições:

a) Um dos pais resida em Portugal há pelo menos cinco anos (mesmo que sem um título legal); b) Um dos pais tenha residência legal em território nacional; c) O menor tenha frequentado, pelo menos, um ano de ensino (pré-escolar, básico, etc.) em Portugal.

A alínea que nos interessa focar, e que está prestes a desaparecer, é a alínea b): "Um dos progenitores tenha residência legal em território nacional".

A força desta alínea está na sua simplicidade. Ela não exige um tempo mínimo de residência dos pais, como os cinco anos da alínea a), nem exige que a criança tenha idade escolar, como a alínea c). Ela exige apenas que, no dia em que o pedido de nacionalidade do menor é submetido, um dos pais já seja titular de uma residência legal.

Um Exemplo Prático e Correto

Vamos usar um exemplo prático que ilustra perfeitamente esta situação, tal como a lei a prevê.

Imaginemos que uma criança nasce em Portugal no dia 10 de janeiro. Nesse exato dia, os seus pais, que são estrangeiros, ainda não têm a sua Autorização de Residência (podem, por exemplo, estar a aguardar a decisão do SEF/AIMA após uma manifestação de interesse). Como os pais não tinham residência legal no momento do nascimento, esta criança não tem direito à nacionalidade originária.

Contudo, o tempo passa e, no dia 1 de junho, um dos pais finalmente recebe e ativa a sua Autorização de Residência. A partir deste dia, o pai ou a mãe é um residente legal.

No dia 2 de junho, esse progenitor decide pedir a nacionalidade para o seu filho menor, nascido em Portugal. É aqui que o Artigo 6.º, n.º 2, alínea b) se aplica: no momento do pedido (dia 2 de junho), um dos pais "tem residência legal em território nacional". A criança cumpre, assim, os requisitos para a nacionalidade portuguesa por naturalização. Esta alínea funciona como uma importante via de correção para a família que se legalizou no país após o nascimento do filho.

O Que Vai Mudar: O Fim da "Segunda Oportunidade"

A proposta de lei aprovada recentemente no Parlamento, e que aguarda os próximos passos para entrar em vigor, revoga a alínea b) do número 2 do Artigo 6.º.

Isto significa, de forma muito direta, que esta "segunda oportunidade" deixará de existir.

Quando a nova lei for publicada, o menor do nosso exemplo ficará numa situação muito diferente. Mesmo que o pai obtenha a sua residência legal no dia 1 de junho, ele já não poderá, no dia 2 de junho, usar esse facto para pedir a nacionalidade do filho. As únicas opções que restarão para essa criança serão as das alíneas a) e c): esperar que um dos pais complete cinco anos de residência em Portugal ou esperar que a própria criança tenha idade para frequentar, pelo menos, um ano de ensino.

Em qualquer dos cenários, a obtenção da nacionalidade para o menor torna-se um processo significativamente mais demorado.

A Urgência do Momento

Esta alteração legislativa é crítica. Enquanto a nova lei não for promulgada e publicada, η regra atual, incluindo a alínea b), continua em vigor.

Estamos, portanto, perante uma janela de oportunidade que se está a fechar rapidamente. Todas as famílias que se encontram nesta situação (filho nascido em Portugal e pais que obtiveram a residência legal após o nascimento) devem agir com a máxima urgência. Os processos que derem entrada nas Conservatórias antes da entrada em vigor da nova lei serão analisados com base na lei atual.

Aconselhamos vivamente que procure aconselhamento jurídico para verificar se o seu caso se enquadra nesta hipótese e, em caso afirmativo, preparar e submeter o pedido o quanto antes.

Além dos benefícios óbvios para o futuro da criança, é importante notar que ter um filho com nacionalidade portuguesa pode criar vantagens interessantes para a situação de residência dos próprios pais estrangeiros. Este é um tema relevante que merece uma análise dedicada, e que abordaremos num próximo artigo.